domingo, 27 de janeiro de 2013

                                       
                                              Fenômeno Assustador

            No início dos anos 90, fui ver, no CIC, o já então famoso “Tangos e Tragédias”, da dupla Nico e Hique; o primeiro, louro, ao acordeom e o outro, moreno, ao violino. Diverti-me fazendo parte do povo que, num desfile “controlado” pela dupla, sai do teatro e encerra o espetáculo no saguão, cantando em uníssono o “Copérnico”: “Na Sbórnia se dança o Copérnico, ô, ô, ô, ô!”. Nos anos seguintes, freqüentador assíduo  do CIC, eu via a cena de saída dos dois comandando o povo que finalmente se retirava, ficando a dupla junto ao balcão da bilheteria, disponível a quem quisesse com eles conversar. Numa dessas ocasiões, conversei com eles e os achei realmente simpáticos.
            Os anos se passaram e eles anunciaram uma mudança radical na programação; afinal, repetir sempre a mesma coisa cansa. Há dois ou três anos, o CIC fechado para obras, resolvi vê-los novamente, no Teatro Pedro Ivo, construído "no meio do nada”, cuja plateia costuma ser composta quase que exclusivamente pela burguesia, pois o acesso é difícil para quem depende de transporte coletivo: estudantes etc. O programa era quase não mudara, apenas mais xoxo; as músicas cantadas mais lentamente e sem o entusiasmo de “outrora”. Pudera, vinte e tantos anos cantando a mesma coisa... Certamente a tentativa de mudança não fora aprovada e eles, pra não perder o trem do sucesso, apenas fizeram alterações na forma, com alguma – muito pouca – novidade.
            O que mais me chamou a atenção, como mudança, foi uma clara zombaria deles com relação ao público, algo que está ficando comum em programas de auditório. Seria, uma certa desforra pelo cansaço do repetitivo ou simplesmente uma tática que envolve humilhação que leva os espectadores a uma catarse? Ou ambas? O fato é que fiquei entre estarrecido e curioso de entender este fenômeno que domina as massas, pois, inseridos no povo, os indivíduos passam a achar normal serem submetidos ao ridículo. Não notei ali qualquer brio ou sentimento de honra naquela massa de “brancos” que ria a barrigas balangantes. Uma massa totalmente a mercê.
Na leitura da vida de Nelson Rodrigues, que afirmava que “toda unanimidade é burra”, interessou-me sobremaneira a parte em que se refere ao “sentimento da massa”; do dia em que, no Maracanã lotado, se sentiu como tal e capaz de acompanhar qualquer asneira daquele coletivo; ele, tão lúcido. Que fenômeno é este que avassala e furta, ao indivíduo, sua identidade, podendo leva-lo a uma conspurcação da qual ele não sairá ileso? Que fenômeno é esse, tão enganador: assustador?
Falamos em “Democracia”, mas até que ponto ela é possível, se estamos a mercê de um bom orador? ... das emoções do momento?
Fácil acusar quem se deixou levar; difícil explicar quando tal acontece conosco.
            Boas reflexões...
            miguel angelo

2 comentários:

  1. Dilamar,
    É mesmo impressionante o fato de estes dois repetirem a mesma cantilena há tantos anos. Ou falta criatividade ou estão presos a algum contrato absurdo. Mas eu conheço gente que já foi vê-los bem mais vezes que nós dois...hahahaha
    abração

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